quinta-feira, 15 de abril de 2010

Perrengue no Cupin Marine



Dia de sol, promessa de muitas ondas e vento terral durante todo o dia. Sabíamos que o mar não seria daqueles que nunca mais iríamos nos esquecer mas, sempre esperamos ser surpreendidos.

Decidimos ir a um pico no litoral sul, que só é acessado com uma trilha estressante com mais de duas horas de uma longa e truculenta caminhada, ou de barco em vinte minutos saindo de uma boca de rio. Com a idade chegando e a semana trazendo a preguiça que só se tira com trinta dias de férias, decidimos fazer o trajeto na embarcação que já nos aguardava.

Vou tentar descrever a mesma para que entendam quão fissurados por surfar ondas desertas nós somos.

Tínhamos em nossa frente, um barco tipo traineira, com casco de madeira, pregos expostos, tinta descascada e uma quantidade de cupins só vista na casa de minha avó no interior de São Paulo.

Sim, haviam cupins no barco. O Motor tinha apenas duas marchas, a lenta avante e a ré, mas provavelmente, pelo tamanho que o mar se encontrava na boca da barra, não necessitaríamos de algo mais potente do que o motor de 8 HP que movia a velharia náutica. Era um barco para 15 pessoas. Amigos, todos nós sabemos que um barco para 15 pessoas não é pequeno e, aquele motor poderia ter pelo menos mais uma dezena de cavalos para o tornarem um pouco mais confiável.

Enfim, pranchas, guarda sol e mantimentos em cima da casa de máquinas e com um sol que brilhava cada vez mais intenso nos estimulou a apressar o piloteiro que comia um pacote de bolachas e ria com nossas piadas e pensamentos matinais.

Assim que adentramos o rio, o astral era mágico. Todos estavam contentes. Fui para a proa do barco e sentei próximo a âncora para admirar a água que estava cristalina quando notei que estava vendo o fundo do rio cada vez mais próximo.

Tomei a liberdade, por conhecer um pouco de navegação e, questionei o simpático piloteiro se a maré não estava seca demais para passarmos pela barra. Com um sorriso e a calma de quem mora na frente de uma praia quase deserta e vive do mar, o senhor disse a seguinte frase:

- Amigão, só teremos certeza na hora que estivermos lá.

Alguns já se olharam dentro do barco sentindo que aquela viagem poderia ser um pouco atribulada.

Assim que encaramos as primeiras marolas, a popa do barco acertou com tudo o fundo e todos pararam de conversar, e assim aconteceu nas próximas 3 ondinhas, até que a embarcação encalhasse. Estava tão raso que quando seis dos nossos amigos desceram, nem os joelhos destes foram molhados.

Com uma cara totalmente lavada, o nosso piloteiro disse:

- E num é que esta raso mesmo!?

Com a saída destes seis amigos, o barco voltou a flutuar e estes o guiaram até uma parte mais profunda que possibilitasse a embarcação a seguir caminho novamente. Porém, uma séria de três ondas entrou e assim que a primeira onda nos arrebatou, a popa do barco bateu novamente com muita força no fundo. Assim que a segunda onda se aproximava, sentimos que o barco não estava perfeitamente centralizado na água e os que estavam dentro do mesmo avisaram o piloteiro que com uma cara de desespero amedrontadora balançava o manche do barco que estava solto, mole...O leme havia quebrado e estávamos sem o menor controle de direção.

Assim que a segundo nos acertou, estávamos de través e o amigo que estava do lado contrário de onda a onda acertara o barco, teve que mergulhar por baixo para não ser amassado pela embarcação. Pensem, eram pelo menos duas tonelados de madeira velha, porém pesada, que poderiam ter esmagado o desafortunado. Todos o procuravam quando este emerge do outro lado, gritando adrenalizado:

- Melhor que um tubo, melhor que um tubo, senti o casco lamber minhas costas, uhuuu!!!

Foi então, que percebendo a gravidade da situação se a segunda onda nos acertasse, que o já não mais sorridente piloteiro, acelerou com todos os 8 pangarés que corriam dentro do motor para que saíssemos da zona de impacto da terceira onda. Assim que sentimos o ronco pífio do motor, a terceira onda nos acertou. Estava no mesmo local, na proa, tentando ver o que aconteceria, e a pancada foi tão forte que voei para o lado e saí do barco me segurando na corrente da âncora para não cair totalmente na água. Recuperei-me e escalei o barco que estava em movimento para voltar pra dentro da embarcação.

Me certifiquei que os cortes e os ralados não precisariam de melhores cuidados e assim que tive a tranquilidade de notar que realmente não precisaria, olhei para os outros dentro da embarcação.

Restaram seis pessoas dentro do mesmo, eu, ainda que quase fora cuspido do local onde estava, um casal, meu irmão e o piloteiro que ouvia berros do outro amigo que restara do grupo que desceu dizendo que poderia ter acontecido um acidente assustador por conta de sua irresponsabilidade.

Perguntei para o meu irmão se estaria bem e, sussurrando em meu ouvido confidenciou:

- Caraca, a mina do cara sentou na minha mão, muito gostosa...

Ele tem quinze anos e o fato mais marcante se tivesse a idade dele também seria este para mim...sorri e perguntei novamente se havia se machucado mas, o mesmo disse que estava bem.

Saldo: Algumas pranchas ficaram a deriva, os bancos se soltaram e quebraram a parede da casa de máquinas e ficaríamos ancorados aguardando o resgate a mais ou menos uns 300 metros da praia enquanto o grupo que havia nos guiada pelo inside da barra, aguardava na areia por outro barco.

Aliviado, por estarmos todos bem, sentei-me ao convés do barco para recuperar a respiração e aguardar o resgate. Olhei em volta e percebi que mesmo com todo o perrengue que passamos, os cupins continuavam a devorar os bancos quebrados do barco com o impacto de maneira frenética. Impressionante. Tirei uma lição disso tudo:

- Foda-se o mundo, pois eu não me chamo Raimundo. Se os cupins continuam a fazer o que gostam, eu também vou!!

Assim que o resgate chegou, fomos levados para a sessão de surfe na praia que pretendíamos aproveitar e o dia foi especial, não só pelo surfe, nem só pelo barco, mas caramba, aqueles cupins são ferozes demais!!

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